Mistérios e Segredos do Sítio Casarão

Mystery and Secrets of the ranch townhouse

quarta-feira, 29 de janeiro de 2014

ELES MORARAM NO PONTO MAIS ALTO DA GRANDE VITÓRIA: O PICO DO MESTRE ÁLVARO!!!

Por Ádson Lima

Já imaginou morar no ponto mais alto da Grande Vitória, enfrentando o frio, raios, cobras, aranhas, o medo e a solidão?


Pois é, isso não é só uma suposição. O ponto mais alto da Região Metropolitana da Grande Vitória já teve alguns habitantes que, por conta do trabalho, vivenciaram uma experiência que é para poucos. O local é o pico do Mestre Álvaro, maciço que tem servido à navegação marítima há séculos, sendo considerado uma das maiores elevações litorâneas da costa brasileira e que abriga uma das últimas áreas de Mata Atlântica de altitude do Espírito Santo, com cerca de 833 metros de altitude, localizado no município da Serra
O monte Mestre Álvaro   Foto: Leonel Albuquerque

Do seu pico têm-se uma vista panorâmica de toda a região metropolitana e avista-se, também, parte dos municípios de Santa Leopoldina, Fundão, Aracruz e Domingos Martins, além de uma bela vista do oceano Atlântico.


O Mestre Álvaro é citado em documentos cartográficos do século XVI e possui um bosque rico em fauna e flora nativas, cachoeiras e algumas cavernas.

Em 1991 foi transformado em Unidade de Conservação sendo criada a Área de Proteção Ambiental (APA) do Mestre Álvaro, pela Lei Estadual nº 4.507/1991. Sua gestão pertence, até o momento, ao Instituo de Defesa Agropecuária e Florestal do Espírito Santo (IDAF), que, junto com a Prefeitura da Serra discutem a sua cogestão, uma vez que trata-se de importante monumento ambiental, histórico, social e turístico para o município, conforme sinalizado na Agenda 21 municipal (fonte: Manual de Atendimento ao Turista - Sebrae).
 

Conhecido como Senhor dos Caminhos, Gesse Magnago ou Jazz Magnago, 34 anos, é um apaixonado pela natureza e dedica, até hoje, parte do seu tempo desbravando o Mestre Álvaro e servindo de guia para grupos que desejam subir o monte. Jazz é Coordenador do grupo Guardiões do Mestre e foi sua paixão pelo monte que abriu as portas para que vivenciasse essa experiência incrível: habitar o pico do Mestre Álvaro como guardião das antenas de rádio, instaladas no topo.



Jazz ficou durante um ano na função (2007-2008), mais por amor ao Mestre do que pelo emprego, já que, segundo ele, o salário e as condições de trabalho não compensavam.



Mas como será viver no topo do Mestre Álvaro? Longe de tudo e de todos, enfrentando o frio, as tempestades e os bichos? É isso que buscamos saber nessa entrevista, concedida ontem (28).



A casa onde moravam.  Foto: Guardiões do Mestre.
Sítio Casarão - O que te levou a morar no topo do Mestre Álvaro?

Senhor dos Caminhos Eu já frequentava o Mestre faz tempo. Uma época comecei a levar meu irmão mais novo lá pra cima... tínhamos um grupo legal, passávamos semanas inteiras acampados... Na ocasião já tinha o , que era o funcionário mais antigo que cuidava dos equipamentos. Um dia, quando estávamos acampados no mestre, ele apareceu convidando para comermos uma feijoada... Ele ficava a semana inteira sozinho. A partir daí, já não usávamos barracas. Levávamos carne fresca e verduras e ficávamos dias com ele. Com o tempo conhecemos os outros funcionários, que revezavam com o Zé (semana sim, semana não)... as trocas aconteciam nas segundas-feiras. Foi aí que surgiu a oportunidade de trabalharmos no local, eu e meu irmão, que ficou lá um ano a mais do que eu.

Sítio Casarão – O que faziam lá, exatamente?

Senhor dos Caminhos tínhamos que vigiar e reparar/trocar os equipamentos, em caso de defeitos. Mas era mais um bico do que um emprego, porque era difícil a empresa conseguir alguém disposto a encarar o serviço. Além disso, as condições de trabalho não eram boas e nem o salário. Mas gostávamos de ficar lá e ganhar, pra isso. Era muito legal.

Sítio Casarão – Que tipo de equipamentos vigiavam?

Senhor dos Caminhos De comunicação: receptores, baterias e as antenas de rádio transmissão da Vale, bombeiros, guarda civil e de rádios de pescadores.

Sítio Casarão - Ficava sozinho?

Senhor dos Caminhos   Eu ficava com meu irmão e as vezes apareciam alguns amigos. Outros funcionários ficavam sozinhos, como o Zé.

Sítio Casarão - Não tinham medo?

Senhor dos Caminhos Medo não. Mas perigo existia. Mas nada que incomodasse tanto (risos)

Sítio Casarão - Que tipo de perigos?

Senhor dos Caminhos De ladrões, baderneiros e, principalmente, dos raios, que eram assustadores.

Sítio Casarão - Era necessário algum conhecimento especifico para o serviço?

Senhor dos Caminhos Conheço um pouco de eletrônica, isso ajudou. Mas não exigiam conhecimentos.

Zé: morador mais antigo. Foto: Guardiões do Mestre.
Sítio Casarão - O isolamento não causava tédio, depressão?

Senhor dos Caminhos Tédio rolou no início. Lá não tem nada para fazer. Com o tempo começamos a perambular pelo Mestre, descobrindo nascentes e novas trilhas. Dai pra frente virou costume subir na segunda-feira e passar a semana procurando coisas legais. Foi nessas aventuras que eu virei o “Senhor dos Caminhos” (risos)

Sítio Casarão - Lá no topo não tem água, como faziam para tomar banho, cozinhar...?

Senhor dos Caminhos Em nossas andanças encontramos uma nascente bem próxima, que ajudou muito no caso da água. Mas na seca tínhamos que descer até a metade do monte para buscar nas cachoeiras. Não era fácil voltar com peso. Juntamos umas 100 garrafas pet, de dois litros, que serviam para armazenarmos cerca de 200 lts. de água, para banho e cozinhar. Para beber, buscávamos água fresca todo dia, na nascente.

Sítio Casarão - Quem levava suprimentos para vocês (comida, remédios...)

Senhor dos Caminhos Comida a empresa fornecia um pouco, toda semana. Mas em geral a gente comprava e levava tudo nas costas, inclusive o gás. Quando acabava era difícil descer com o botijão vazio e, pior ainda, subir com ele cheio. Já os remédios nós brigávamos para receber, embora nunca tivessem fornecido. Nós mantínhamos por conta própria uma farmacinha básica. Tudo lá era transportado no “lombo”. O ruim era quando tinha equipamento para subir (painel solar, turbina e bateria). Mas a empresa pagava um pessoal para ajudar no transporte.

Dentro da casa: condições precárias. Foto: Guardiões do Mestre.
Sítio Casarão - Não tiveram problemas com picadas de cobra, aranha...?

Senhor dos Caminhos Nunca tivemos. Vira e mexe entrava um bicho e dava muito trabalho para espantarmos. O Zé já foi surpreendido, acordando com uma jararaca na cabeça.



Sítio Casarão – E as mudanças climáticas lá em cima, como enfrentavam?

Senhor dos Caminhos Tínhamos colchonetes e cobertores bons, não sentíamos frio, embora fizesse muito. O pior eram as tormentas elétricas, pois não podíamos sair por causa dos raios. A ventania também incomodava muito. Tinha vez que o vento era tão maluco que chovia de baixo para cima e as turbinas apontavam em direções diferentes. Era o momento que, de fato, tínhamos medo. Mas uma coisa é certa: a vista e a paz que o local proporciona compensavam todas as dificuldades, esforço, cansaço e medo.

Subindo com os equipamentos. Foto: Guardiões do Mestre.
Sítio Casarão – Algum episódio estranho ou perigoso?

Senhor dos Caminhos Tirando os raios, que assustavam, a gente não se arriscava tanto...  Já estanho, tinha muitas coisas...

Sítio Casarão – Que tipo de coisas?

Senhor dos Caminhos Barulhos desconhecidos, principalmente.

Sítio Casarão – Algum que tenha chamado mais a atenção, despertado medo?

Senhor dos Caminhos Muitos. Mas em geral sempre ficávamos assustados quando chegava gente de madrugada, o barulho dos bichos e os barulhos não identificados, ambos assustam. Mas os raios eram os mais temidos pois o barulho era assustador.  Caiam nas torres. Imagina uma bobina da EDP Escelsa carregando com aquele barulho, só que muito mais assustador e bem no seu teto (risos)

Sítio Casarão – Vocês tinham TV, rádio, celular... lá em cima?

Senhor dos Caminhos Sim. Rádio, e a AM pega até três estações no mesmo canal. Já a FM pegava muito bem, sinal limpo e a TV, uma beleza. Mas os equipamentos eram nossos, a empresa não fornecia.

Sítio Casarão – Tinham alguma fonte geradora de energia lá?

Senhor dos Caminhos Painel solar aos montes e turbinas de vento. Tínhamos cerca de 20 baterias.

Uma das várias cachoeiras do Mestre - Foto: Guardiões do Mestre.
Sítio Casarão – A empresa ainda mantém funcionários lá em cima?

Senhor dos Caminhos Ainda funciona tudo, mas não mora ninguém lá em cima. A segurança é feita por câmeras e um funcionário, cá em baixo, monitorando tudo. Parece que a empresa cansou de pagar indenização aos funcionários.

Sítio Casarão - Que tipo de animais a gente encontra no Mestre?

Senhor dos Caminhos Vamos começar pelos legais: veados, tem uma pequena população deles lá em cima; cachorro do mato, mais para o lado de Pitanga (bairro localizado no pé do Mestre); o gataçu, maior felino do Mestre que é do tamanho de um cachorro e muito fedorento; paca, tatu, irara, lagartos, muitos pássaros como jacupemba, macuco, jaó... macacos, prego e barbado (bugio)... e os temidos, como as cobras e as aranhas...

Sítio Casarão grande parte desses animais não é fácil de ver... eles se mantém longe das trilhas?

Senhor dos Caminhos Sim. Para chegar a ver algum desses só montando uma 'espera' e ficando quieto. Subindo em grupo não rola porque eles assustam e fogem logo. Nas trilhas só achamos lagartos e cobras, com sorte, macacos.

Sítio Casarão – Existe caça ilegal no Mestre?

Senhor dos Caminhos Sim. Caçadores ainda rodam lá, Já encontramos muitas armadilhas, inclusive recentemente.

Sítio Casarão – Já foi proposto a construção de um teleférico no Mestre, o que você acha disso?

Senhor dos Caminhos Teleférico até que já pensei onde seria. Mas para se alcançar o topo, teria que ser vários postos. Só discordo de tudo que seja construção permanente. Tenho um acampamento de base, mais em baixo, feito com pedra amontoada e terra. Acho que é o máximo que se pode fazer, sem alteração.

Sítio Casarão – Vocês já exploraram todo o monte?

Senhor dos Caminhos Meu grupo, Guardiões do Mestre, está mapeando as trilhas existentes e os cursos d'água. Descobrimos lugares espetaculares e isolados. Mas muita área ainda é desconhecida, por ser de difícil acesso.

Nascentes: as fontes da vida! Foto: Guardiões do Mestre.
Sítio Casarão – Quais a atrações, no Mestre?

Senhor dos Caminhos Eu recomendo: Três Marias e o Morro do Céu, muito legais e ainda preservados, fechado, mato quase intocado.

Sítio Casarão – E qual o seu lugar preferido, que você recomendaria aos turistas e visitante?

Senhor dos Caminhos Mais bonito eu afirmo que é o local onde temos o acampamento base, que só conhece quem levamos (risos)

Sítio Casarão – O que tem de especial nele?

Senhor dos Caminhos No nosso acampamento tem a cachoeira mais limpa do monte, já que não tem gente andando por lá e o nosso vale fica bem distante das trilhas principais.

Sítio Casarão –  Existem outros guias e grupos que trabalham no Mestre. Vocês recebem alguma ajuda de custo da APA do Mestre Álvaro?

Senhor dos Caminhos Nada! Gostaríamos mesmo de saber a que passo anda isso. Minha intenção é mapear tudo que der e fazer um trabalho completo e correto para a administração pública. Já vi o material oficial do Iema (Instituto Estadual de Meio Ambiente), com um mapeamento bem inferior ao nosso e incompleto. O que eu já fiz sozinho tem mais informações e precisão do que esse, que devem ter pago uma fortuna e não tem qualidade e precisão. Lugares de difícil acesso, que nós conhecemos bem, estão equivocados no mapa oficial, do Iema.

Vista parcial do topo - Foto: Guardiões do Mestre.
Sítio Casarão – A APA do Mestre Álvaro é estadual e toda área de preservação recebe recursos e possui um conselho gestor... Vocês conhecem o conselho e participam?

Senhor dos Caminhos Conheço gente que tem contato coma gestão da APA, mas ninguém acredita muito na gestão... Não existe nada concreto, para o Mestre. Se algum recurso do Estado sai para a APA do Mestre Àlvaro, não creio que chega lá...

Sítio Casarão – Quem desejar te contratar como guia, como te encontrar?

Senhor dos Caminhos Por telefone, podem ligar para (27) 99622 3637. Temos um diferencial: não subimos pelas trilhas principais, buscamos as trilhas onde a paisagem é mais bonita e a natureza mais presente e subimos em qualquer horário (dia ou noite).

Sítio Casarão – Hoje você só trabalha como guia ou exerce outra atividade?

Senhor dos Caminhos Tenho emprego fixo. Mas vou sempre ao Mestre, chova ou faça sol. Hoje estou casado e minha esposa também gosta muito do Mestre. Ela não conhecia e se apaixonou quando a levei... agora sobe até sozinha (risos)

Sítio Casarão – O que o Mestre significa para você?


O Senhor dos caminhos: "sou menino do

Mestre e não abro mão desse canto".
Foto Guardiões do Mestre.
Senhor dos Caminhos Sempre gostei desse morro, sempre quis mapear e conhecê-lo melhor. Agora, com mais de 20 anos de mato, já estou conseguindo alguma coisa... Digo até que não me interessa outro lugar, sou menino do Mestre e não abro mão desse canto! Hoje o Mestre Álvaro faz parte da minha vida, é minha segunda casa, meu acampamento é fixo, passo pelo menos cinco a 10 noites lá, por mês. Gosto de explorá-lo, buscar novos lugares, mapear cachoeiras, tentar ver os bichos... Creio que já subi o monte umas 5 mil vezes, ou mais (risos)

Sítio Casarão – O grupo de apaixonados pelo mestre é grande, não?

Senhor dos Caminhos Sim. Tem uma galera de gente boa. O Bismarck é parceiro dos melhores, o Márcio, Vitor, Patrick... tem a galera do GPAMA (Grupo de Proteção Ambiental Mestre Álvaro) que também fazem um trabalho super legal e um grupo novo, o AVES (Aventureiros do ES)...  São grupos e indivíduos que defendem e contribuem com a preservação do Mestre Álvaro.

Sítio Casarão – Gostaria de fazer alguma consideração em relação ao Mestre Álvaro, aos visitantes ou aos órgãos públicos?

Senhor dos Caminhos Gostaria sim, mas o palavreado não sairia legal (risos)

Sítio Casarão – Sinta-se a vontade... Filtraremos os palavrões (risos)

Senhor dos Caminhos É muito tempo sem ver nada útil na região do Mestre que são muitas as insatisfações... Para os visitantes: que levem muita água (no mínimo 2 litros) e não deixem sujeira no monte. Levou, traga de volta! Para os governantes: tomem vergonha e cuidem do Mestre. Nas trilhas encontramos muito lixo, e, num futuro próximo teremos só pedreiras e não o monte. Faltam também projetos e a UFES (Universidade Federal do Espírito Santo) sei lá, é a Universidade que temos e nem os formandos de geografia fazem pesquisa lá. Aprendi muito com grupos de geógrafos que guiei no Mestre e eles reclamaram bastante da falta de incentivo. Sinto a necessidade de obter mais conhecimento, principalmente sobre a vegetação, para explicar melhor aos visitantes.

Jazz Magnago, o Senhor dos Caminhos (esquerda) e seu irmão Orlando, no acampamento.

2 comentários:

Unknown disse...

Poxa amo o Mestre Alvaro. Acampei muito la

Anônimo disse...

Casado kkkkkkk sei

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